Servidores avaliam que ao admitir em Cuiabá que jamais houve proposta fechada, que nada fará para derrubar veto e que o parâmetro do que negocia é 4 anos, presidente do STF ratifica, sem querer, acerto da luta para aprovar PLC 28 e da greve contra o veto e por negociações em outro patamar
O reconhecimento por parte do presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, de que jamais houve proposta de acordo fechada e muito menos apresentada aos trabalhadores do Judiciário Federal em contrapartida ao PLC 28, reforça o acerto da decisão da categoria de lutar pela aprovação do projeto e, agora, de manter a greve pela derrubada do veto.
É o que avaliam dirigentes sindicais ouvidos pela reportagem, que observam ainda que é a força da mobilização e da pressão para que o Congresso Nacional reveja o veto da presidente Dilma Rousseff (PT) que poderá levar à negociação que pode assegurar não só o reajuste que reponha as perdas, como os recursos necessários para implantá-lo. "À medida que você pressiona para derrubar o veto você também pressiona para que haja negociação", observa Pedro Aparecido, dirigente da federação nacional (Fenajufe) e do sindicato da categoria em Mato Grosso (Sindijufe-MT), que participou ao lado de outros servidores da conversa de quase uma hora com Lewandowski em Cuiabá, na sexta-feira (24), resultado de um longo dia de protestos da greve, que 'recebeu' o ministro na visita que fez à capital do estado.
Na reunião, o ministro admitiu que não foi apresentada proposta alguma a servidores antes da votação do projeto no Senado – como vêm sugerindo a direção-geral do tribunal e alguns sindicalistas que apoiam o governo – pelo inapelável motivo que não havia e nem há nada acertado sobre isso. É a segunda vez que ele desmente o seu auxiliar em duas semanas. Antes, teria afirmado que conversara com a presidente Dilma em Portugal sobre o PLC 28 e que seguiria negociando com o governo o projeto mesmo após o veto – algo, aliás, repetido na conversa em Cuiabá, relatada pelo jornalista Luiz Perlato e da qual também participaram os servidores Amer Khalil Okdi, Eliane Rodrigues e Rodrigo de Carvalho.
Negociações
Em Mato Grosso, Lewandowski disse ainda que as negociações estavam, na avaliação dele, avançadas quando o projeto passou no Congresso. Mas não é a primeira vez que o ministro sinaliza possíveis soluções para impasses nessa ou em versões anteriores do projeto de reajuste. Além disso, o presidente da mais alta corte do país deixou claro que a negociação que estaria sendo travada pelo STF passa pelo parcelamento da proposta em quatro longos anos. Todas as reestruturações de planos de cargos anteriores foram parceladas, o que significou perdas. Mas jamais por tão extenso período.
O presidente do Supremo não entrou em detalhes sobre como seria esse parcelamento em negociação pelo tribunal - sem consulta aos servidores, é bom frisar. É possível que se enquadre nos parâmetros da contraproposta ofertada pelo Ministério do Planejamento ao conjunto do funcionalismo, com índices de reajuste previamente definidos para cada janeiro de 2016 a 2019, mesmo que com diferenças nos percentuais. Algo que tende a não repor nem as perdas futuras, muito menos as passadas. E bem distinto da aplicação do projeto em parcelas semestrais. O parcelamento em quatro anos já foi rejeitado pelo conjunto das entidades sindicais dos servidores federais de forma unânime.
Greve e pressão
Em praticamente todo o país, as assembleias da categoria aprovaram a manutenção da luta e da greve pelo reajuste salarial e pela derrubada do veto – mesmo tendo-se a consciência de que derrubá-lo é uma tarefa difícil e que exigirá muito dos servidores. Há um sentimento nacional no Judiciário Federal e no MPU de que não dá para confiar na promessa de uma incerta, nada transparente e unilateral negociação, na qual os trabalhadores nem sequer são consultados.
Isso, no entanto, não significa dizer que os sindicatos, a federação e os servidores se recusam a negociar. Ao longo dos últimos meses, foram eles os que mais defenderam e clamaram por negociações que solucionassem a questão salarial. O governo se limitava a pedir mais e mais prazos para chegar a um suposto acordo – o que na visão oficial do STF estava próximo quando o Senado votou o PLC 28. O que não explicam nem Lewandowski, nem o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, é porque não se acelerou em alguns dias ou horas as negociações para que algo concreto fosse apresentado ao Senado e aos servidores. A data da votação já era de conhecimento público há quase um mês.
Talvez seja mais sensato acreditar no que o próprio presidente do STF disse aos servidores em Cuiabá: eventual proposta que saia dessas conversas só será divulgada após o fechamento das negociações do governo com os servidores do Executivo. Ele não disse, mas é razoável supor que se isso é para valer é tanto para o momento atual quanto teria sido para 30 de junho, quando milhares de servidores foram às ruas exigir a aprovação do PLC 28.
Tramitação do veto
Não há data previsível para votação do veto. Mas se sabe, segundo a assessoria parlamentar da federação, que o presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), tem a prerrogativa de convocar a qualquer momento uma sessão extraordinária para tratar dos 18 vetos que já trancam a pauta. E que nada regimentalmente impediria a inclusão do PLC 28 nesse bloco. Há ainda a possibilidade de votação na próxima sessão ordinária, prevista para 18 de agosto, mesmo com o veto do reajuste só trancando a pauta do Congresso três dias depois. Tudo, porém, passa por acordos políticos entre as lideranças parlamentares do Senado e da Câmara, sobre os quais os servidores querem incidir.
Para que um veto seja derrubado, é necessária a maioria absoluta dos votos de deputados e senadores – 257 e 41, respectivamente. As duas casas têm que votar contra o veto. Caso uma delas não faça isso, ele é mantido. Antes de Dilma vetar o projeto, os sindicatos e servidores já haviam coletado mais de 300 assinaturas de deputados e 50 de senadores favoráveis à sanção do PLC 28. A empreitada continua, assim como a greve, que já enfrenta retaliações das administrações em alguns estados – respondidas com a manutenção da paralisação e da mobilização.
O número de parlamentares que declararam apoio não chega a assegurar nada. O governo trabalha no alto escalão para tentar impedir a derrubada do veto. Incluiu o PLC 28 na proposta de pacto com os governadores contra o que chama de 'pautas-bombas' do Congresso. Alguns governadores tucanos, segundo o jornal "Folha de São Paulo", já teriam declarado apoio, entre eles o do Paraná, Beto Richa (PSDB), que ganhou notoriedade nacional ao lançar a tropa de choque da Polícia Militar contra professores no primeiro semestre desse ano. "O governo tem medo que haja veto, se o governo tem medo é porque é possível", raciocina Pedro Aparecido, sem deixar de ressaltar os obstáculos que precisam ser superados para isso.
O presidente do STF, por sua vez, disse aos servidores que não se moverá pela derrubada do veto, embora ressalve que é um direito dos servidores fazê-lo. Após o governo, com certa cumplicidade do Congresso, desrespeitar o orçamento do Poder Judiciário e do MPU por seis anos consecutivos, Lewandowski disse que qualquer atuação sua avançaria sobre a autonomia de outro poder. "O STF foi desrespeitado e chamado de incompetente pelo Executivo e isso exige uma resposta muito mais firme do que a nota tímida [divulgada] pelo tribunal", diz Adilson Rodrigues, servidor da Justiça Federal em Santos (SP) e da coordenação da Fenajufe, referindo-se ao curto comunicado oficial emitido após o veto, justificado pelo governo com o argumento de que a lei é inconstitucional – nota que, apesar de limitada, avalia o servidor, só saiu por conta da imensa "pressão dos servidores”.
A questão orçamentária
A avaliação de que é possível derrubar o veto com o fortalecimento da greve e a pressão sobre os parlamentares não se contrapõe à necessidade de também incidir sobre o governo e o Supremo para que as negociações ocorram, em patamares e circunstâncias naturalmente diferentes dos que o Planalto tenta impor com a já evidente anuência do presidente do STF.
Por outro lado, parece fantasioso e até infantil a tentativa de sindicalistas ligados à CUT de emplacar a versão de que a categoria errou ao insistir na votação e que agora Dilma não só manterá o veto como se negará a negociar. A categoria sabe que existe o risco de o governo barrar o projeto, porém não porque ele foi aprovado no Senado. Mas porque é isso que sucessivos governos petistas fazem há seis anos sem que, ao longo desse período, jamais tenha sido apresentada uma única proposta alternativa e plausível de acordo. Para digerir os argumentos que veem no dia 30 de junho um desastre, é precisa acreditar que após ser derrotado no Senado numa votação tão contundente, o governo tenha saído fortalecido ao ponto de impor o reajuste zero aos servidores e se negar até a negociar.
O resultado da conversa com Lewandowski na capital mato-grossense, obtida à base da persistência, ensurdecedoras vuvuzelas e de afinada articulação, não confirmou apenas o que já se dizia. Também deixou mais cristalino que para construir um desfecho favorável nessa peleja os servidores dependem cada vez mais de sua força coletiva. E que isso passa tanto por lutar pela derrubada do veto, quanto por exigir que o STF faça a sua parte. Mesmo com a lei aprovada, ela só entra em vigor caso exista previsão de recursos para aplicá-la."O objetivo final é a reposição das perdas, queremos a lei por completo, com validade e eficácia. A experiência de três PCS nos diz que a [vitória] dessa luta termina no acordo orçamentário", afirma Adilson, ao ressaltar o momento ímpar que vive a categoria nessa campanha que busca corrigir perdas do passado e tecer um futuro diferente do que alguns tentam vender como inevitável.
Fonte: LutaFenajufe Notícias