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Notícia postada dia 23/08/2013

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Um retrato da terceirização e os perigos do PL 4330/04

Um retrato da terceirização e os perigos do PL 4330/04

Projeto de lei poderá abrir as portas para a privatização e precarização do serviço público


 Por Caê Batista

Aos 62 anos de idade, Luci da Silva aguarda o início de sua audiência na 13ª vara trabalhista, no fórum Ruy Barbosa. Por seis anos, ela vendeu sua força de trabalho a uma empresa “especializada” em limpeza. Recebia R$ 20 diários, não tinha registro em carteira e trabalhava 12 horas por dia. A motivação para “colocar no pau”, como ela diz, ocorreu num domingo. “Cheguei sete horas da manhã, às 10h a supervisora falou: ‘pode ir embora, não tem lugar para você não’”, conta.


Umas das testemunhas que acompanham Luci se chama Silvana dos Santos, 28 anos. Ela trabalhou na mesma empresa e relata que não tinham horário de almoço, e que a empresa servia marmita com comida azeda aos trabalhadores. Silvana tinha a carteira assinada e foi demitida por justa causa após sofrer um acidente durante um evento em que trabalhava. Para reaver os direitos negados, ingressou na Justiça e aceitou o acordo de cerca de cinco mil reais.


Coletados na quinta-feira, 15 de agosto, os depoimentos retratam o que é a terceirização. E situações semelhantes a essas se repetem diariamente centenas de vezes no fórum. “É a ampla maioria [dos processos]”, opina o servidor Marcos Maringoni, diretor da 13ª Vara, sobre as ações contra empresas terceirizadas. Ele diz que os casos são cada vez mais comuns, onde são pleiteados o pagamento de horas-extras e verbas rescisórias, depósito de fundo de garantia e INSS.


Depois da sentença dada, o problema passa a ser como fazer a ‘empresa’ terceirizada quitar o que deve. “Eu diria que 95% das execuções em face a essas empresas é negativa”, estima Maringoni, que completa: “essas empresas não têm nada que caucione as dívidas, não têm propriedade, dinheiro”.


Na Justiça Trabalhista desde 1982, Sandra Maria Souza completa: “as execuções contra empresas terceirizadas são complicadas, pois elas evaporam. A justiça acaba condenando o responsável subsidiário, o tomador de serviço”.


Sandra diz que “há casos de empresa cujo quadro societário é formado por outras empresas e algumas estão no exterior. É muito difícil uma empresa terceirizada pagar e cumprir a obrigação que foi reconhecida na sentença”.


A servidora descreve que muitas empresas tomadoras de serviço, já antevendo uma condenação, fazem um acordo e se livram da execução.


Não obtivemos números oficiais sobre o impacto da terceirização no crescimento do volume processual, mas “é impossível ir à Justiça do Trabalho e não se deparar, nas milhares de audiências que ocorrem a cada dia, com ações nas quais trabalhadores terceirizados buscam direitos de verbas rescisórias, que deixaram de ser pagas por empresas terceirizadas, que sumiram”.


A descrição é do professor da USP e Juiz do Trabalho Jorge Souto Maior e está no artigo “PL 4330, o Shopping Center Fabril: Dogville mostra a sua cara e as possibilidades de redenção”.


Para Souto Maior, “a terceirização ao longo de 20 anos em que se instituiu no cenário das relações de trabalho no Brasil, desde quando foi incentivada pela Súmula 331, do TST, em 1993, serviu para o aumento vertiginoso da precarização das condições de trabalho”.


Tramita no Congresso Nacional, entretanto, o projeto de lei 4330/2004, que poderá abrir as portas para a terceirização de forma indiscriminada. De autoria do deputado do PMDB de Goiás Sandro Mabel, o PL autoriza que sejam terceirizados todos os ramos dos setores produtivos e de serviços.


Diz Souto Maior no artigo: “E o projeto (4330/04) vem preconizar que terceirização ‘é técnica moderna de administração do trabalho’! mas de fato, representa uma estratégia de destruição da classe trabalhadora, de inviabilização do antagonismo de classe, servindo ao aumento da exploração do trabalhador, que se vê reduzido à condição de coisa invisível...”.


Alguém até poderia dizer que o PL não afetaria o serviço público, menos ainda o Judiciário. Mas caso se torne lei, as consequências para a Justiça Trabalhista seriam quase imediatas, com o aumento do volume processual. Além disso, o PL poderá abrir as portas para a terceirização dentro do serviço público.


“Pelo o que estava colocado [no PL], significava a precarização do serviço público nas mãos do setor privado”, opina Paulo Barela, servidor do IBGE e um dos responsáveis da CSP-Conlutas para o setor de funcionalismo público.


Ele destaca que a terceirização já acontece no serviço público, explicando que até o final do ano, o órgão em que trabalha irá contratar sete mil terceirizados para “o serviço de coleta de dados e rotina, com o salário de R$ 850”. “Esse PL significa a intensificação do rebaixamento salarial. É uma grande reforma trabalhista, com prejuízos para o serviço público”, opina.


Barela concorda com Souto Maior: o PL 4330 está na contra mão das reivindicações que tomaram o Brasil em junho. “Por acaso, alguém viu, nas manifestações de junho, alguém ir às ruas pedir ‘mais terceirização’, ‘mais precarização no trabalho’, ‘mais segregação’ ou rebaixamento de salários’?”, questiona o magistrado no artigo. Já Barela sentencia: “É um projeto criminoso contra os interesses da população”.


Problemas com empresas terceirizadas no TRF-3

O TRF-3 é o tribunal onde ocorrem muitos problemas com empresas terceirizadas. Em 2011, a empresa DP PortSeg ficou sem pagar seus funcionários por meses. O Sintrajud interveio e denunciou a situação ao Ministério Público do Trabalho, além de exigir da administração uma solução imediata para o caso.


Atualmente, segundo relato de servidores do TRF-3, a empresa TB, responsável pela limpeza do tribunal, paga um salário mínimo para quem trabalha oito horas e pouco mais de R$ 400 para quem trabalha quatro horas.


“Quando ocorreram as manifestações [na jornada de Junho] e o TRF dispensou os funcionários, as moças da limpeza que vieram até a portaria foram dispensadas e o dia foi descontado do salário. Ainda perderam o sábado e o domingo [Descanso Semanal Remunerado]”, conta um diretor de base do Sintrajud.


A empresa que presta serviço de ascensoristas chama-se Ambraserv. Sem sede em São Paulo, as trabalhadoras têm muitas dificuldades solucionarem problemas corriqueiros. Há denúncias de que a empresa não tem depositado o fundo de garantia regularmente.


“Muitas vezes eles atrasam os salários ou deixam de depositar o de uma das ascensoristas. Fazemos um rateio para que ela pague o aluguel e não seja despejada”, conta.


Na semana passada, o TRF-3 dispensou quatro ascensoristas. Informações dão conta de que ficarão apenas seis ascensoristas. “Há um grau de estresse e medo muito grande entre elas”, conta.


Terceirização no TRF-1

Em 12 de agosto, a presidência do TRF-1 publicou a resolução “PRESI/CENAG 17/2013”, extinguindo cargos de técnicos e auxiliares judiciários. “A atividade correspondente à categoria funcional em processo de extinção será objeto de execução indireta”, pontua o texto.


STF afasta responsabilidade da Administração Pública em casos de terceirização

Em 24 de novembro de 2010, ao julgar a ADC 16, o STF afastou a transferência automática de encargos trabalhistas à Administração Pública em casos de empresas terceirizadas inadimplentes. No site, o Supremo pontua que “O TST tem reconhecido é que a omissão culposa da administração em relação à fiscalização gera responsabilidade da União”.


A mesma nota informa: “Por interessar a todos os órgãos públicos, não só federais como também estaduais e municipais, os governos da maioria dos estados e de muitos municípios, sobretudo de grandes capitais, assim como a União, pediram para aderir como amici curiae (amigos da corte) nesta ADC”.



 

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