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Notícia postada dia 13/12/2012

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Cadê a reforma agrária? (Em memória de Niemeyer)

Cadê a reforma agrária? (Em memória de Niemeyer)

Quem vai deter a voracidade insaciável do agronegócio, que fez da sinistra Kátia Abreu a nova paladina do ‘progresso’ nacional?
 
*Luiz Ricardo Leitão
 
A imprensa do mundo inteiro destacou a morte de Oscar Niemeyer, concedendo enorme atenção à vasta obra que o centenário arquiteto criou em diversos rincões do planeta. Este cronista, porém, julga mais relevante sublinhar a perda que sofreram os militantes da “batalha das ideias” em plena era biocibernética do capital globalizado. De fato, em face da difusa conjuntura que vive nossa Bruzundanga, quem mais nos fará falta será o homem de elevados ideais e sólidas convicções socialistas, capaz de declarar, com um destemor cada dia mais raro, que, “quando a vida se degrada e a esperança foge do coração dos homens, a revolução é o caminho a seguir.”               
 
Com isso, não subestimo a copiosa produção de quem erigiu cidades, prédios, catedrais e mesquitas, reescrevendo a história da arquitetura no Brasil e no mundo. É claro que ela não pode ser dissociada de certos eventos bastante complexos e polêmicos do século 20, em especial a inserção da América Latina nos rumos tortuosos da modernidade capitalista – uma contradição por si mesma insolúvel. Quem conhece o trabalho de Le Corbusier e sua obsessão pelos dilemas urbanísticos da expansão viária dos “países em desenvolvimento”, cujo ícone de industrialização foi o automóvel, sabe que o tema não é nada simples.              
 
Os desafios que Oscar enfrentou seguem na ordem do dia, sejam as aporias da modernização de um país inscrito na periferia do capitalismo, seja a busca de uma solução humanista para a iniquidade social vigente no Brasil e em todo o planeta. Nesse campo, o seu mérito foi inestimável – e, exatamente por isso, despertou tanta ira velada nas elites de Bruzundanga, historicamente avessas ao povo e sempre deslumbradas com as metrópoles e impérios do I Mundo. Não por acaso, um bobo da corte local, ciente de que em pleno velório seu veneno surtiria mais efeito, tratou de ‘postar’ em sua coluna virtual um artigo tachando-o de “metade gênio, metade idiota”.        
 
A genialidade, obviamente, estaria restrita às artes. No campo social, por certo, postular que o mais importante “é a vida, o sujeito viver bem, de mão dada” soa como uma ‘idiotice’ para todos aqueles que creem plenamente na sociedade de consumo hipertrofiada e que já foram capazes de subscrever a cantilena de Fukuyama, pregando, no auge do neoliberalismo, em meio à queda do Muro, o fim inelutável da história. Por isso, incomoda-os gente como Niemeyer ou o eterno guerrilheiro Fidel, que cometeu a suprema heresia de propor, em resposta à globalização do capital, a globalização da solidariedade – o mantra que rege a atuação de Cuba na cena internacional, espalhando médicos e mestres pelo planeta.              
 
Cá na terrinha, porém, a conjuntura é ainda mais delicada. Mote cíclico na história da República, o virulento discurso do moralismo udenista espraia-se de norte a sul, subscrito inclusive por setores do poderoso PT, que caíram na traiçoeira arapuca já entrevista na Carta aos brasileiros (esse ‘pacto’ de não agressão à burguesia que ajudou a eleger Lula em 2002). É claro que certos episódios grotescos, como as estripulias da Srª Rosemary Noronha, fazem a alegria da mídia, sobretudo os porta-vozes da secular elite paulista, que até hoje não digeriu a derrota para Gegê & Cia. na década de 1930...         
 
Assim, enquanto a imprensa se delicia com as revelações do affaire Noronha (cá entre nós, caro leitor, barganhar convite para camarote no carnaval de São Paulo e cabine em cruzeiro para ver Bruno & Marrone é dose para elefante...), a verdadeira política sucumbe na terrinha. Cadê a reforma agrária? Quem vai deter a voracidade insaciável do agronegócio, que fez da sinistra Kátia Abreu a nova paladina do ‘progresso’ nacional? Como assegurar que os royalties do pré-sal sejam efetivamente investidos em áreas sociais, especialmente em nossa pífia Educação, sem que as tchurmas da bandana (como aquela composta por Cabral, Cavendish e seus pares) abocanhem a melhor parte do filé?             
 
Salvo a resistência heroica do MST e de outros atores sociais, além das incisivas intervenções de personalidades como o já saudoso Niemeyer, essa pauta sucumbiu no pântano do moralismo, em que as mazelas da “corrupção endêmica” são açoitadas sem trégua pelos próceres da nação, gente do quilate de ACM Neto, Álvaro Dias, Aécio Neves e outros da mesma laia. Eis porque eu brado: Volta, Niemeyer! Não nos deixe sós nesta árdua etapa da luta de classes tupiniquim. Axé, meu padrinho! Axé!

 

*Luiz Ricardo Leitão é escritor e professor associado da UERJ. Doutor em Estudos Literários pela Universidade de La Habana, é autor de Noel Rosa – Poeta da Vila,Cronista do Brasil e de Lima Barreto – o rebelde imprescindível.



 

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